foto: Namídia
* Por Celaine Refosco
O acerto no trabalho de Ronaldo Fraga vem de muito. Um dos poucos artistas da cena de moda brasileira que revela unidade criativa e constância de criação.
Criar é difícil, ser coeso e criativo simultaneamente, isto é, ser o mesmo e ser novo, ser melhor a cada vez, não é bolinho. A qualidade sublime, que pode trazer lágrimas aos olhos da platéia na frente da passarela, elevando de fato a moda ao estado de arte, no caso do Ronaldo começa muito antes, começa na escolha dos temas, invariavelmente incríveis. Em geral Ronaldo escolhe (ele diz que é escolhido!) obras magníficas de artistas absolutamente consistentes e coerentes, mestres, pra falar a respeito.
Constrói sua obra a partir de Louise de Bourgeois, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, Pina Bausch, Lupicinio Rodrigues. A coerência que começa na eleição, se estende inequivocamente pela qualidade estética do apresentado e vira antes que mais nada um diálogo, que apresenta e revela a beleza original e a nova beleza construída sob seu olhar, fresquinha, renovada.
Agora, o Athos Bulcão, com sua plástica limpa e inconfundível, construída de linhas decididas e cores absolutas é o assunto que Ronaldo revira e mistura, revelando vida e obra.
Na sala de desfile imagens, suspensos do teto quadrados que mostram desenhos breves que trazem os azulejos de Athos à cena. A música de Baden Powell abre o acontecimento e toda a sala escura se ilumina de emoção.
O desfile inicia com tecidos pesados, de cores contrastantes e desenhos precisos. De longe parecem recortes, mas depois, vendo-os de perto, são jacquards, lindos. Os volumes amplos, suspensos pelos ombros as vezes deixam aparecer mangas também amplas, pesadas. Evoluem dos azulejos e da geometria marcada para peças inteiramente construídas com imagens, os carnavais de Athos, mostrados em fotos preto e branco, também jacquard. Maravilhosos.
fotos: Namídia
Enquanto a música passeia pelo Brasil os vestidos, algumas calças e saias acompanhados de blusas simples de modelagem e sofisticadas de imagem, se tornam leves e fluidos e trocam a imagem em jacquard por estamparia, mostrando paletas de cores, parecendo cenas de ateliês. Há peças que parecem nuvens, leves, fofas, que flutuam através da musica, trazendo saudades de Brasis e desejos de futuros bons.
fotos: Celaine Refosco
Tudo encerra com Vinicius de Moraes e o momento mais emocionante em que entram todas as modelos, adoro este momento e no final de tudo aparece Seu Ronaldo, sorridente. A ministra da Cultura, Ana de Holanda, estava exatamente na minha frente, no lado oposto, primeira fila. Marina Silva, que havia causado um alvoroço na entrada, continuava alvoroçando ao final. Paulo Borges recebia e tomava conta de tudo. Lembrando aqui que Ronaldo e Paulo ocupam as cadeiras da moda que agora tem lugar no Ministério da Cultura.
O Brasil, que na minha infância fazia parte do terceiro mundo, tem tido um desenvolvimento econômico que surpreende a todos galgando posições entre os países mais bem sucedidos economicamente. Na mesma noite do desfile Ronaldo falava sobre o crescimento e importância da indústria têxtil e de moda no programa Roda viva, da TV Cultura.
Eu acredito que através da moda, e fora dela, o país além de dinheiro possa aprender a cuidar-se mais, selecionar, valorizar.
O desfile do Ronaldo, que mais que um desfile é mais uma celebração, nutre a esperança de que a gente enriqueça de fato, de tudo.
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