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sábado, 10 de setembro de 2011

Até quando seguiremos sem planejamento urbano e regional?


A crescente convergência das malhas urbanas de Palhoça, São José, Florianópolis e Biguaçu – que juntas constituem um aglomerado com população estimada em 850 mil habitantes – nos coloca diante de um desafio inadiável: apresentar soluções e respostas aos problemas e oportunidades decorrentes deste tipo de crescimento das cidades. Ainda que alguns municípios tenham Plano Diretor, isto não é suficiente para orientar o desenvolvimento e a expansão das cidades de forma conjunta e equilibrada. O fato de estes planos serem elaborados a partir de abordagens diferenciadas, tanto no quesito técnico quanto temporal, explica a limitação de sua aplicação quando não inclui orientações para o conjunto das cidades.

A existência de um Plano Diretor, portanto, não isenta a cidade, o aglomerado urbano e a região metropolitana de manter um processo permanente de planejamento territorial e urbano. Caso contrário, corre-se o risco de empreender ações desarticuladas e não compartilhadas entre os municípios, ou ainda unilaterais e isoladas, com sérios riscos impostos à coletividade, que por sua vez é dependente do funcionamento deste sistema urbano.

As questões relacionadas ao transporte e mobilidade, sistema viário, habitação, segurança, saneamento, meio ambiente e desenvolvimento sustentável, dentre outras, são de grande complexidade. Nos aglomerados urbanos, em especial, esta complexidade é ampliada, seja pelo potencial aumento das interações possíveis, seja pela falta de uma instância governamental capaz de mediar interesses e convergir ações e investimentos de forma articulada e efetiva entre as cidades.

Apesar do agravamento dos problemas urbanos, percebe-se que as várias instâncias do poder público continuam competindo entre si por popularidade, e consumindo valiosos recursos públicos em obras que, supostamente, deveriam aliviar os sintomas mais pungentes da sociedade. O que se vê, no entanto, são propostas de duplicações de trechos de vias, mais e mais aterros, obras de elevados, pontes, túneis e outras soluções viárias saindo do papel sem garantias de conexões adequadas ao sistema urbano existente, carecendo de estudos isentos e aprofundados, capazes de examinar as causas dos problemas e embasar a decisão quanto às alternativas apresentadas.

A cada nova promessa de soluções mágicas, com projetos que mais parecem ter saído da cartola, fica flagrante a inexistência de estudos para identificar a raiz e a extensão dos problemas urbanos. Há demonstração de falta de planejamento, pois os projetos surgem com significativo atraso, e de falta de compromisso, pela sobreposição de ações anunciadas de forma politiqueira. Por fim, o lançamento atropelado de editais para estudo de viabilidade levanta dúvidas, ao privilegiar determinada alternativa tecnológica. A prática torna-se ainda mais curiosa quando a contratação do projeto básico da obra é atrelada ao referido estudo de viabilidade… Quem, interessado na execução do projeto e até da obra, poderia concluir pela inviabilidade da proposta quando já está ao seu alcance assumir o projeto executivo da mesma?

Tomemos o exemplo das inúmeras propostas para “solucionar” o transporte de massa entre as quatro cidades mencionadas neste artigo. Cotidianamente, tais propostas são apresentadas com a maior naturalidade, ainda que não respondam às questões mais básicas. Que problema esta solução busca resolver? Por que o edital de contratação deste projeto salvador privilegia determinada alternativa tecnológica, omitindo ou restringindo a comparação com outras? Onde estão os estudos e o planejamento que orientarão os investimentos necessários?

Enquanto nos deixamos iludir ou distrair por tais promessas, um tempo precioso do desenvolvimento da cidade é desperdiçado. Ao passo que se acumulam e agravam os inconvenientes da vida urbana, a pressão será cada vez maior sobre o cidadão. Cedo ou tarde, cada um precisará desenvolver uma visão crítica, capaz de avaliar e perceber a precariedade dos projetos de enfrentamento destas intrincadas questões coletivas e, quem sabe, finalmente, dar um basta a tanto simulacro de planejamento.

* Edson Cattoni, arquiteto e urbanista, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento Santa Catarina (IAB-SC).

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